Relato do primeiro diretor

Os primórdios do Instituto de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Federal de Ouro Preto

Palestra proferida pelo Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho dia 9 de novembro de 2004 na abertura do I Encontro Memorial do  ICHS – Nossa HISTÓRIA com todas as LETRAS, em comemoração aos 25 anos do Instituto de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Federal de Ouro Preto.

IN HOC ALIQUID GAUDEO DISCERE ET DOCERE
Eis a minha alegria aprender para ensinar (Sêneca)

- Introdução
- Origens do ICHS
- Dois empreendimentos, um único objetivo
- O reconhecimento dos cursos universitários em Mariana
- Glorioso 9 de novembro de 1979
- A importância do ICHS para a UFOP
- Objetivos do ICHS
- Organização dos departamentos e primeiras atividades acadêmicas
- Excelência do corpo docente
- A tônica dos nove anos e meio iniciais
- A valorização das Ciências Sociais
- Conclusão
- Fontes
 

INTRODUÇÃO

Nada é tão gratificante como remontar aos primórdios do Instituto de Ciências Humanas e Sociais (ICHS), quando se iniciam as comemorações de seus 25 anos.  Aqui se acha para seu relato quem acompanhou de perto todos os lances para que fosse este Instituto implantado em Mariana, tendo sido por nove anos e meio seu primeiro Diretor, o qual teve sempre em mente uma administração participativa de todos os segmentos.

Para os atuais mestres, funcionários e alunos se trata de uma viagem às origens.

Para aqueles que participaram ativamente dos esforços iniciais desta obra vitoriosa é um recordar que traz à baila o dito latino que, provavelmente, no princípio deste Instituto, lhes terá passado pela mente, sentença famosa do poeta latino Virgílio: Haec olim meminisse juvabit – Um dia será agradável recordar estas coisas (Eneida livro I, v.203).

Desejamos de plano reverenciar a memória dos Professores Giovanni Nicolau de Souza, Lázaro Pinto da Silva, Carmo Tavares da Silva, Luís Vitor Tavares de Azevedo, Carlos dos Reis Baeta Braga, companheiros da primeira hora, que já ingressaram na eternidade, mas cujos méritos e benemerências jamais serão esquecidos. Lembramo-nos, outrossim, neste instante da professora Delma Bretas, também falecida, e  que aqui, posteriormente,  prestou seus valiosos serviços.

Todos os instantes da existência são importantes, porque parcelas preciosas do tempo, outorgado a cada um em vista à harmonia do cosmos, tarefa para a qual todos somos convocados como instrumentos insubstituíveis.

Há momentos, porém, pela sua repercussão, por força da densidade de seu significado, que se tornam mais fundamente marcantes.

É o que acontece nestes dias no ICHS.

Estamos trazendo à memória uma trajetória que, ao se tornar luminosa, é uma consagração dos esforços que devem sempre existir a favor da educação neste país, no qual não basta combater a fome e o desemprego, mas também no qual cumpre dar uma formação sólida àqueles que se orgulham de viver nesta pátria bem amada, mas, por vezes, tão mal governada.

ORIGENS DO ICHS

O ICHS nasceu sob o signo do idealismo e do dinamismo.

Idealismo daqueles que desde 1960, tendo à frente o Arcebispo Dom Oscar de Oliveira, almejavam continuar correspondendo à vocação desta Cidade de Mariana, berço da civilização mineira, palpitante de tradições humanísticas.

Dinamismo, compendiado na atuação daqueles que compreenderam os nobres desígnios do Antístite marianense e lhe deram todo apoio, correspondendo inclusive ao empenho do Metropolita para que o ideal dos Conjurados Mineiros do século XVIII se concretizasse, qual seja, houvesse uma Universidade em Ouro Preto.

O ICHS foi o resultado da conjunção de contribuições valiosíssimas que somadas fizeram com que se tornasse uma realidade a Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) e nela este Instituto.

Tudo foi efeito de um processo.

A palavra latina procedere significa um caminhar para frente, ir adiante; seguimento, curso, marcha, sair para fora. Supõe então uma seqüência lógica de ações num ritmo contínuo, mas que exclui o queimar etapas. Leibniz, o notável filósofo alemão, num momento de pulcra inspiração, declarou: natura non facit saltus – a natureza não dá saltos, e a natureza é uma ótima mestra.

Cumpre plantar e esperar os resultados.

Desde o início de seu episcopado em Mariana no ano de 1959, D. Oscar de Oliveira foi procurado pelos dirigentes da Escola de Minas e de Farmácia de Ouro Preto, ambas de tanto renome no Brasil, no sentido de que se implantasse a Universidade daquela cidade.

Em 1963 estiveram com ele membros da Diretoria das referidas Escolas de Minas e de Farmácia os quais lhe apresentaram o ante-projeto  de lei da UFOP, assinado pelos professores Antônio Pinheiro Filho, Moacyr do Amaral Lisboa, Washington Moraes de Andrade, Jair Carvalho da Silva e pelo Presidente do Diretório Acadêmico, Serafim Carvalho Melo, os quais pediam seu apoio à criação da desejada Universidade. Neste ante-projeto de lei,  no artigo 2º parágrafo 2º, estava claramente expresso: “O Instituto de Ciências Humanas e Sociais será instalado na cidade de MARIANA, Estado de Minas Gerais”.

Foram inúmeras as viagens que esta Comissão e o Arcebispo fizeram ao Rio de Janeiro onde ainda funcionava o Ministério da Educação e da Cultura, sendo o Ministro,  Tarso Dutra.  Depois os entendimentos se prolongaram em Brasília.

Árdua época do plantio!

Com sua experiência, D. Oscar de Oliveira já havia percebido que era necessário agilizar a formação de professores para esta região e, na verdade, para que houvesse, inicialmente, mestres competentes e que ostentassem as condições jurídicas e pedagógicas para exercerem o magistério até à 8ª série, ou seja, professores aptos para o atual Ensino Fundamental.

In illo tempore, há 43 anos atrás, havia, ao lado de bons Mestres, uma boa parte de professores leigos, sem, portanto, maiores conhecimentos didáticos. Alguns com o excelente Curso de Magistério de então, outros sem conhecimentos  para além do antigo Curso Primário.

A título de ilustração, se registre que o ensino da História do Brasil,  além de ser eminentemente factual, era restrito ao que a ideologia governamental fora transmitindo desde o período colonial num triste emaranhado de distorções que visavam a consagração do status quo.  Bom conhecedor de geografia era quem conhecesse de cor e salteado as principais capitais do mundo. Quem bem as enunciasse era considerado um privilegiado “capitalista”, como com ufania diziam alguns professores de então. Os alunos eram obrigados a decorar os afluentes do Rio Amazonas: Juruá, Tefé, Purus, Madeira, Tapajós, Xingu e, como diria Carlos Heitor Cony, sem saber até que ponto tamanha sabedoria era necessária à vida deles, “a pessoal e a profissional”. O ensino da Língua Pátria era, da parte de diversos professores, o decorar de regras gramaticais, como as 22 normas da concordância do verbo com o sujeito, um martírio para as mentes juvenis. Estudar literatura significada para eles o memorizar trechos ou poesias de autores clássicos. Da parte de alguns leigos nem isto era ministrado e eles se valiam até de almanaques para suas “aulas”. Outras aberrações eram observadas naqueles tempos e daí a preocupação de D. Oscar de Oliveira.

É certo que a Universidade Federal de Minas Gerais ministrava o CADES, Curso de aprimoramento do Ensino Secundário, que dava direito a um certificado provisório, mas que deixava, evidentemente, muito a desejar. Tratava-se do Certificado de Habilitação em Exames de Suficiência de acordo com o artigo 117 da Lei 4.024 de 20.12.1961.

 

DOIS EMPREENDIMENTOS, UM ÚNICO OBJETIVO

Dom Oscar, portanto, batalhou em duas frentes: de início a instalação em Mariana dos Cursos de Licenciatura de 1º grau, Extensão da Universidade Católica de Minas Gerais e, concomitantemente, a instalação da Universidade Federal de Ouro Preto que incorporaria tais Cursos.

O primeiro passo foi a criação da Fundação Marianense de Educação que surgiu pela Lei n. 3070 de dezembro de 1964. Através dela, foi possível captar verbas para ajudar na manutenção dos Cursos de Licenciatura da Universidade Católica de Minas Gerais. A Fundação Marianense de Educação teve sua Assembléia Geral de Constituição dia 31 de agosto de 1971 na Residência Arquiepiscopal. A Prefeitura de Mariana prestou, desde o início, seu apoio à Fundação Marianense de Educação, destinando-lhe também valiosas contribuições financeiras.

Havia já sido firmado na Cúria Metropolitana um convênio entre a Arquidiocese de Mariana e a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Santa Maria, da Universidade Católica de Minas Gerais, para que fossem instalados em 1969 os Cursos de Licenciatura de 1º grau para formar professores de Letras, Estudos Sociais e Ciências. Estes passaram a funcionar, à noite, no Colégio Providência.  O Ministro da Educação havia, antes, dia 27 de janeiro, comunicado a D. Serafim Fernandes Araújo, Reitor da Universidade Católica, que de acordo com o Decreto-Lei n. 405 parágrafo 3º do artigo 4, de 31 de dezembro de 1968, a instalação de cursos daquela Universidade fora da sede dependia exclusivamente das Universidades. Assim, sendo, os cursos em Mariana possuíam situação legal definida. Isto ocorreu dia 12 de fevereiro de 1969.

Adite-se que através do Ofício 348/69, datado de 10 de setembro de 1969, D. Serafim declarava que não fazia nenhuma objeção a que estes Cursos viessem a fazer parte da UFOP.

Foi no dia 21 de agosto de 1969 publicado o DECRETO-LEI que autorizava a implantação da UFOP. Um dos primeiros a serem comunicados foi D. Oscar de Oliveira que recebeu telegrama do então Presidente da República, Arthur da Costa e Silva, anunciando a faustosa notícia.

Levaria, porém, dez anos para que os Cursos de Mariana fossem incorporados à novel Universidade, cuja implantação foi sendo lentamente conquistada.

O então Diretor da Escola de Minas, Dr. Antônio Pinheiro Filho, em carta dirigida a D. Oscar, datada de 25 de março de 1970, informava: “Está em Ouro Preto o Dr. Celso de Carvalho, especialista em organização universitária, que aqui veio para reajustar a nossa Universidade ao padrão nacional e para a feitura de seu Estatuto. Elaborado este, tem-se o instrumento necessário e suficiente para tratar-se, com a devida propriedade, no caso de sua muito querida Faculdade de Filosofia.  Assim, está de pé a incorporação ou agregação, no tempo oportuno, da Faculdade de Filosofia, que deverá continuar funcionando em Mariana”.

Em 1971, Dom Oscar foi procurado, novamente, por ilustres professores de Ouro Preto que lhe reafirmaram esta incorporação e lhe pediam  telegrafasse às autoridades federais no sentido da imediata instalação efetiva da UFOP. Ao Arcebispo chegou o seguinte telegrama à tarde de 27 de agosto de 1971: “Acuso recebimento telegrama Vossencia Reverendíssima dirigido senhor Presidente República e informo assunto pelo SECOR 47395 de 23.08.71 encaminhado exame Ministro da Educação e Cultura. Sergio N. Médici, Secretário particular”.

O RECONHECIMENTO DOS CURSOS UNIVERSITÁRIOS EM MARIANA

Apesar de ser legal o funcionamento dos referidos Cursos de Licenciatura, Extensão da Universidade Católica de Minas Gerais, uma árdua batalha foi o reconhecimento dos mesmos pelo MEC, ou seja, a aprovação por aquele Ministério da estrutura física, do corpo docente e da biblioteca, do laboratório de ciências e demais condições de funcionamento.

O prestígio de D. Oscar de Oliveira junto ao Ministro Jarbas Passarinho foi decisivo para que dificuldades sem número fossem contornadas e, após grandes labores, dia 22 de maio de 1975 chegou a Mariana a grata notícia, anunciando que tinham sido reconhecidos os Cursos, podendo os Diplomas ser emitidos.

Havia já uma onda de insatisfação por parte dos que haviam terminado os Cursos e foi, em boa hora, que se resolveu o impasse.

O que vale sempre são as idéias que tendem a se concretizar em atos luminosos por entre mil dificuldades a serem vencidas com perseverança na busca  constante do bem comum.

Desde o início, conforme frisamos, ficou claro, perante o Reitor da Universidade Católica de Minas Gerais, D. Serafim Fernandes de Araújo e dos dirigentes ouropretanos que, tão logo fosse criada a Universidade Federal de Ouro Preto, tais cursos seriam incorporados à mesma, continuando a funcionar em Mariana. Como foi também relatado, tal era também o compromisso de todos os que compunham a Comissão que trabalhava pela instalação da UFOP.

Os Cursos de Licenciatura de 1º grau tiveram enorme aceitação sendo sempre preenchidas todas as matrículas, salientando-se ter sido mínima a desistência por parte dos matriculados nos mesmos.

Professores da Escola de Minas e de Farmácia prestaram, desde o início, sua colaboração para o Curso de Ciências e a Universidade Católica de Minas Gerais ajudou a compor o Corpo Docente do Curso de Letras e Estudos Sociais.

Tão logo as primeiras turmas terminaram tais Cursos se providenciou a Licenciatura plena em História, Geografia, Língua Portuguesa e Matemática, autorizados tais Cursos pelo Parecer nº 1670/77 de dois de junho de 1976. Ao receber o diploma de Licenciatura Plena, professores de Mariana e Ouro Preto começaram a fazer a Especialização na Universidade Católica em Belo Horizonte. Muitos depois foram contratados, sendo posteriormente incorporados à UFOP.

GLORIOSO 9 DE NOVEMBRO DE 1979

Quando o Professor Antônio Fagundes de Souza assumiu a Reitoria da UFOP em 1979 as perspectivas de incorporação aumentaram sensivelmente, tanto mais que, no Diário Oficial, dia 26 de janeiro daquele ano, havia sido publicado o Estatuto da UFOP e pelo artigo 38, inciso “i” letra “l”, estava previsto o Instituto de Ciências Humanas, Letras e Artes, estando portanto abertas amplas perspectivas para que ocorresse a incorporação dos Cursos de Mariana.

Dia 9 de novembro de 1979 o Professor Fagundes foi recebido festivamente em Mariana. Após a Missa, celebrada por D. Oscar na Igreja de São Francisco, em histórico pronunciamento, o Reitor incorporou administrativamente a Faculdade de Filosofia de Mariana à UFOP sob aplausos de quantos lotavam o referido templo.

Nascia ali o ICHS!

Até então, segundo dados fornecidos pela competente secretária da Faculdade de Filosofia de Mariana (FAFIM), Efigênia Aparecida da Silva Paulino publicados pela “Revista Rua Direita” já haviam recebido diplomas  1346 alunos nas diversas áreas da então Licenciatura de 1º grau e 104 de Licenciatura Plena.

Para que isto acontecesse não se pode olvidar a atuação do marianense Prof. Dr. Wilson Chaves um dos principais dirigentes da Universidade Católica de Minas Gerais.

A situação acadêmica dos Cursos do ICHS foi sendo regulamentada pelo Conselho de Ensino e Pesquisa e Extensão da UFOP.

Para organização inicial dos Currículos dos Cursos de Letras e História e seus respectivos bachalerados, notável foi a contribuição das Professoras  da Universidade Federal de Minas Gerais, Maria Efigênia Lage Resende, Doutora em História e Eunice Dutra Galery, Doutora em Letras, sendo que o Curso de Ciências passou a ser  ministrado em Ouro Preto.

Estes Currículos foram depois sendo modificados com o passar dos anos de acordo com os estudos feitos pelos Departamentos.

Ao serem incorporados à UFOP todos os pertences dos Cursos de Licenciatura foram passados para aquela Universidade pela Fundação Marianense de Educação, inclusive 11.000 exemplares da Biblioteca que fora organizada de acordo com o Conselho Federal de Educação como uma das exigências para o reconhecimento dos referidos Cursos.

Uma das medidas mais sábias e louváveis de D. Oscar foi entregar em regime de comodato os prédios do Antigo Seminário Menor e do Palácio dos Bispos que seriam restaurados pela UFOP para neles funcionar o ICHS.

Cumpria, porém, que a UFOP tivesse posses em Mariana e o Arcebispo que já havia doado terreno para as Casas Populares, para o Hospital Monsenhor Horta e para outros nobilíssimos fins, doou também à Universidade Federal de Ouro Preto terreno anexo aos referidos prédios, ficando, evidentemente, fora o acesso aos mesmos por um princípio elementar do Direito, atinente à servidão urbana.

Dia 26 de agosto de 1984 o jornal O ARQUIDIOCESANO (nº 1302, p. 3) publicou um relatório sobre as obras já realizadas no prédio, tudo feito dentro do maior rigor científico, dada a importância do edifício e a extensão dos trabalhos.

É de se notar que dia 26 de janeiro de 1984 o Presidente da República, João Batista de Figueiredo, visitou as obras de reforma do Antigo Prédio do Seminário Menor  tendo ficado impressionado com o valor artístico da Capela, lamentando o precário estado em que a mesma se encontrava e louvando os esforços para a rápida restauração de tudo. S. Exª aqui esteve na companhia do Reitor Maurício Lanski  que continuara a obra do Prof. Fagundes.

Observe-se que Universidade Federal de Ouro Preto, para cuja criação, como vimos, tanto fizera D. Oscar, dando-lhe sempre todo apoio, prestou expressiva homenagem a S. Exª dia 5 de maio de 1988 em Ouro Preto, quando o Arcebispo deixava o governo da Arquidiocese. Os discursos então proferidos expressaram bem o quanto era a UFOP agradecida a seu grande benfeitor.

 

A IMPORTÂNCIA DO ICHS PARA A UFOP

Para a Escola de Minas e a Escola de Farmácia foi importantíssima, desde o início, a atuação do ICHS.

É que se faz sempre necessária a reavaliação metafísica do homem e um crédito nas possibilidades deste ser racional a cujo serviço deve estar a ciência e a técnica. À organização universitária cabe oferecer opções que possibilitem ao próprio homem a plena humanização do meio no qual ele atua.

Era, naquele momento, urgente, diante do peso da tradição científica das duas Escolas ouropretanas, injetar na novel Universidade o humanismo que o ICHS cultivaria para possibilitar, plenamente, a visão integral do homem.

De fato, toda Universidade precisa crescer horizontal e verticalmente visualizando o ser pensante em sua totalidade e imunidade, isto é, em sua inteireza ontológica, sujeito de ciência e consciência, de cultura e civilização, de trabalho e produção, de esperança e fé, de tempo e eternidade. Neste sentido o Departamento de Educação então confiado ao Professor José Sebastião Maia foi o primeiro a atuar junto à organização pedagógica de todos os Cursos da UFOP.

O intercâmbio foi crescendo com o passar dos meses e foi importante o fato do ICHS funcionar em Mariana o que permitiu que este não sofresse as influências de algumas práticas tradicionais que vigoravam nos  cursos das venerandas Escolas de Minas e de Farmácia.

 

OBJETIVOS DO ICHS

Desde sua criação, o ICHS teve como objetivo prioritário um ensino de alto nível, voltado para a pesquisa, centrada na mais eficiente metodologia, levando à comunidade na qual estava inserido, uma contribuição efetiva.

Meta não menos importante foi sempre a formação humana daqueles que assumem a grave responsabilidade de educar novas gerações. Daí a preocupação de suscitar uma liderança intelectual capaz de instaurar uma ordem sócio-econômica justa, humana. Isso num contexto lógico no qual a idéia tenha o primado sobre a imagem e o som, os quais deixam o ser racional na periferia dos fatos e à mercê de manipulações sofísticas.  Apelo diuturno para a maior potência do homem que é o privilégio de poder raciocinar, após captar a qüididade das coisas. É, deste modo, que o ser pensante com toda a pujança de seu espírito pode descortinar horizontes mais amplos, sem se enclausurar no sensível.

Grande a preocupação, ab initio, com o trinômio sagrado ter- ser – viver, pois, se o ter pode aprisionar no consumismo, não bastar ser, caindo-se num imobilismo deletério, mas cumpre viver numa valorização da existência, o que leva o homem a engrandecer o seu espaço e o seu tempo, pois não são nem o lugar, nem o contexto que fazem a magnitude deste microcosmos que é o homem. Isto se torna o resultante daquela riqueza interior possuída e vivida, porque se abrem veredas para gratificantes valores.

Daí o empenho em formar aqueles que possam, realmente, oferecer a outros as jóias da sabedoria, da cultura, dos sentimentos nobres, dignos, elevados que beatificam e engrandecem. Pensadores argutos capazes de orientar, dirigir, apontar rumos à sociedade. Educadores capazes, pedagogos atualizados, mentores abalizados, pesquisadores criativos e beneméritos.

Durante nove anos e meio pudemos, como Diretor, acompanhar de perto a evolução deste Instituto que foi colimando todos estes nobres alvos por meio de mestres competentes que compuseram o Corpo Docente.

ORGANIZAÇÃO DOS DEPARTAMENTOS E PRIMEIRAS ATIVIDADES ACADÊMICAS

Mereceu especial atenção a etapa de implantação dos Departamentos de Letras, História e Educação e de seus respectivos Laboratórios, para que se evitasse de plano qualquer tipo de distorção rumo aos ideais propostos.

É que, como foi dito, a 9 de novembro de 1979 havia surgido o ICHS que foi  oficializado pela Portaria 048/80 de 25 de março de 1980, mas apenas em janeiro de 1981 é que começou a ser colocado em execução o projeto de implantação do mesmo.

A primeira reunião do Conselho Departamental do ICHS se realizou dia 19 de março de 1981, quando, com a presença do Magnífico Reitor Prof. Antônio Fagundes de Souza, foi mostrada a responsabilidade que pesava sobre os ombros da equipe que estava implantando o novo Instituto.

O primeiro trabalho deste Conselho foi redigir o Regimento Interno do ICHS.

O primeiro chefe do Departamento de História (DEHIS) foi Gilberto Guerzoni Filho, do Departamento de Letras (DELET), Leda Maria Martins, tendo o professor José Sebastião Maia ficado encarregado do Departamento de Educação (DEEDU). Theo Araújo Santiago, passou a presidir o Colegiado de Cursos de História, Jânia Martins Ramos, o do Curso de Letras. Crisoston Terto Vilas Boas, foi nomeado o Representante dos Professores de História no Conselho Departamental, Carmo Tavares da Silva, o Representante dos Professores de Letras e José Donizeti Silva, Representante dos Alunos.

A contratação dos novos Professores de História e Letras foi feita através de Concursos Públicos o que se tornou uma norma para toda a UFOP.

Em 1982 o ICHS promoveu o I Encontro de Pesquisa com intensa participação dos Professores e Alunos.

Até 1987 foram promovidos sob a Coordenação da Diretoria Ciclos Anuais de Estudos sob temas diversos, tendo vindo ao ICHS os maiores especialistas nos assuntos tratados.

A partir de 1988, cada Departamento passou a fazer suas promoções culturais específicas, as quais alcançaram, outrossim, êxito total com satisfação geral dos participantes.

EXCELÊNCIA DO CORPO DOCENTE

Desde o início, grande foi o empenho para que houvesse aqui um Corpo Docente qualificado.

Assim é que em 1982, quando apenas 25  eram os professores no ICHS, já havia um doutor e um mestre em Letras, uma mestranda em Lingüística, uma mestranda em Língua francesa, duas especialistas em Redação, um especialista em Literatura Brasileira; na área de História, um professor  em fase de elaboração de tese de doutorado, um mestre, quatro mestrandos, dois especialistas; no setor de Educação um PhD.

A maioria já estava em regime de 40 horas. Foi sempre facilitada saída dos professores para completarem sua capacitação.

O Diretor mesmo em 1985 deu seu voto de Minerva para que o professor José Carlos Reis fosse fazer o doutorado na França, assumindo suas aulas de Teoria da História.

A mais completa assistência sempre foi dada sobretudo àqueles que estavam no exterior e guardamos com carinho as missivas de agradecimentos destes colegas que em longínquas plagas se aprimoravam a bem deste Instituto.

Quando este Instituto fez acontecer o 1º Ciclo de Estudos, no ano de  1983,  aqui estiveram grandes conferencistas de renome internacional e, entre eles, o Professor Francisco Iglesias que afirmou ao Diretor: “Este Instituto está começando muito bem com professores do mais alto gabarito e, entre outros, citava Gilberto Guerzoni Filho, Crisóston Terto Vilas Boas, Theo Araújo Santiago,  José Arnaldo Coelho de Aguiar Lima. Idêntico o pensamento de Gilberto Mendonça Teles que citava Jânia Martins Ramos, Leda Maria Martins, Heliana Maria Brina Brandão, Hebe Maria Rôlla Santos, Flávio Carneiro Rodrigues. É de se notar que participaram deste 1º Ciclo de Estudos professores e alunos de várias Universidades brasileiras, inclusive da Bahia e do Rio Grande do Norte.

Intensa a publicação de livros e trabalhos científicos que já os primeiros Relatórios anuais registram, bem como a participação em Congressos, Simpósios, Mesas Redondas em diversas Universidades do país.

Vitoriosos foram os esforços para enriquecer a Biblioteca “Alphonsus de Guimaraens”, tanto mais que havia sempre muita restrição à área de Ciências Humanas e, até por parte do MEC, as maiores verbas se destinavam aos Cursos de Ciências Naturais.

Cursos de Extensão foram oferecidos, desde o início deste Instituto, mormente, de Língua inglesa, francesa e italiana e de História Geral da Arte.

Já nos seus primórdios o ICHS contou com um Corpo de Funcionários eficientes, distribuídos nos três turnos, muitos dos quais até hoje aqui prestando seus inestimáveis serviços como Rosimeire da Fonseca, Marly Elias Veisac, Lídia Libânio da Silva, Clélia Maria Faria da Silva, Antônio Calixto da Silva.

Inovações metodológicas foram sendo introduzidas a cada semestre, as quais imprimiram um aprimorado ritmo acadêmico em todos os aspectos.

É de se notar que o sistema de avaliação da aprendizagem trouxe excelentes resultados.

Assembléias foram desde o princípio realizadas com os alunos debatendo o ICHS como um todo.

Intercâmbios internacionais iam sendo firmados, sobretudo, na área de Língua estrangeira.

No contexto atual no qual a questão da Previdência  está, mais do que nunca, na ordem do dia, registre-se que notável foi em 1983 ter o ICHS sediado de 21 a 25 de março, o Curso de Legislação Previdenciária de Custeio, patrocinado pela Secretaria Regional de Arrecadação e Fiscalização em Minas Gerais do MPS/IAPAS.

Interessante que dia 25 de abril de 1983 aqui esteve o Professor Thorsten Husen da Universidade de Estocolmo, especialista em Educação, membro da UNESCO, Professor visitante e conferencista em várias universidades americanas e se discutiram durante várias horas questões pedagógicas. Da Suécia, depois, enviou ele uma carta na qual exprimia sua satisfação pelo que viu no ICHS.

É de se notar também que na comemoração do 4º aniversário do ICHS,  de 7 a 11 de novembro de 1983, um dos conferencistas foi o Dr. Cristóvão Buarque, que exerceu, recentemente, o cargo de Ministro da Educação.

Em 1983 chegaram ao fim com êxito total os trabalhos do projeto de Integração UFOP com o Ensino de 1º Grau MEC/SESu/UFOP/ ICHS, tendo a Professora Francisca Martins Gonçalves do DEEDU publicado o livro “Escola, Saber e Vida”, até hoje referência em Bibliografias de trabalhos especializados.

A TÔNICA DOS NOVE ANOS E MEIO INICIAIS

Durante nove anos e meio, para que os esforços de implantação e consolidação deste Instituto dessem resultado o que se pretendeu, ano a ano, foi reexaminar a cada passo as metas propostas através do diagnóstico das perspectivas que iam surgindo, levantadas a partir do potencial emergente e das conquistas concretas até então alcançadas.

Sempre estivemos convictos de que cumpre diuturnamente analisar as convergências e as sintonias e superar as divergências e conflitos por meio do diálogo, numa conjugação da participação de todos, respeitados os princípios de liberdade individual e a eqüidade social à luz dos interesses comuns.

Por isto mesmo as soluções das questões iam surgindo num intercâmbio enriquecedor de planos e experiências. Cumpre continuamente respeitar os espaços de contribuição  individual e do aprimoramento coletivo.

Nada de soluções dogmáticas, herméticas, fechadas, desprovidas de sínteses superadoras.

Neste sentido o ICHS propugnou pela reforma do Estatuto e do Regimento da UFOP, o que felizmente acabou acontecendo, oferecendo tal reforma maior flexibilização que agilizou todo o processo administrativo e pedagógico.

Estivemos sempre convencidos de que a práxis educativa moderna, embasada num realismo imune de retórica, deve desencadear ações  eficazes e uma renovação constante de métodos, fruto da compreensão dialética da conjuntura então vivida a exigir uma constante adaptabilidade às novas situações.

A aceleração da história requer, realmente, uma maleabilidade que inclui um esforço ininterrupto de uma reciclagem permanente. Somente assim  são impedidas alienações desastrosas, as mistificações e falácias que geram comportamentos desprovidos de perspectiva história e conteúdo cultural.

Não basta a união mecânica entre intenções e deveres, mas urge persistentemente a fusão de posturas, rendimentos e talentos para formação de uma consciência voltada para a emancipação humana e a transformação social.

Universidade é por excelência a instância na qual se deve construir uma ordem democrática e estávamos persuadidos de que o ICHS teria uma missão especial dentro da UFOP no sentido de modernizar as estruturas seculares vigentes.

Para tanto propugnamos sempre por um trabalho conjunto de alto nível e o Corpo Discente e de Funcionários compreendeu isto e,  eficientemente, colaborou, possibilitando a consolidação deste Instituto.

Em 1983, por exemplo, grandes eram as dificuldades por causa, como foi registrado, do reduzido número de professores e funcionários, mas, sobretudo, nos momentos de pique de serviço houve em todos os setores uma ajuda mútua que minimizou as carências. Este comportamento refletiu, de fato, no Corpo Discente e foi uma filosofia de ação que prosseguiu nos anos seguintes e, até hoje, pelas notícias que sempre se teve do ICHS.

Tratava-se de um objetivo indescartável, sobretudo num país que valoriza tão pouco a Educação.

Tudo foi proposto, porém,sem mecanismos idiossincráticos, racionalistas e burocráticos.

A VALORIZAÇÃO DAS CIÊNCIAS SOCIAIS

Desde o início, partimos do princípio que tudo isto era necessário  para mais valorizadas se tornassem as Ciências Sociais sobretudo diante das duas tradicionais Escolas de Minas e de Farmácia.

Mesmo para o MEC, nos idos de 1979, as Ciências Exatas eram bem mais privilegiadas em detrimento das Ciências Humanas. Cumpria abrir  espaços para esta área, iluminando o campo da compreensão da realidade do ser racional.

Ora, de fato, profundo o humanismo que flui das Letras e da História e dos demais setores em que laboram os cientistas sociais.

Entretanto, sabíamos que a dimensão do humano, vítima de um reducionismo deletério, somente ganharia corpo na medida em que a revisão de valores fosse feita por intelectuais competentes que oferecessem horizontes mais amplos para a intuição, a volição e a percepções superiores.

De fato, os que lidam com as Letras e a História têm uma tremenda responsabilidade, dado que podem abrir as portas abertas para o salvífico humanismo.

O homem não pode ser guiado por leis que exigem uma exatidão geométrica ou ser reduzido a esquemas numéricos para figurar em estatísticas.

É preciso fixar sempre o lídimo personalismo.

Cada ser humano é, realmente, um projeto pessoal e intransferível.

Existe um universo de valores e de cultura que as Letras e a História acentuam, possibilitando a saída do imanente rumo ao transcendente.

Humanizar para salvar o ser racional eis a tarefa sublime das Ciências Sociais e daí toda a preocupação em se dar base sólida a este Instituto.

Ao reler, estes dias,  o documento que o Prof. Dr. Luiz Carlos Villalta, então Diretor do ICHS, divulgado dia 8 de janeiro de 2002, percebemos ao vivo que as metas continuaram a ser colimadas com total êxito numa ascensão contínua a trajetória deste Instituto.

CONCLUSÃO

Foi esta a base que oferecemos para que a missão histórica do ICHS tivesse perenidade.

Os que neste ínício de milênio aqui labutam enfrentam o efêmero  da cultura de hoje. Em 1987, Gille Lipovetsky, sociólogo e Professor francês, denunciava que um vazio,sem tragédia nem apocalipse, passava a reger o mundo atual.

Intelectuais acometidos de senilidade precoce, militantes do insignificante protestaram com veemência, mas o jovem filósofo tinha razão.

Giles preconizava um combate à frivolidade imperante, à apatia, à indiferença, tanto mais que a sedução havia tomado lugar à convicção. Assistia-se à desagregação da sociedade, dos costumes, do indivíduo colocado a reboque do consumismo. Erosão das identidades sociais com prevalência do individualismo, sendo visível, por exemplo, a exacerbação sexual. Notava-se já uma fratura da socialização disciplinar, ao lado, porém, de fatores positivos como o culto da naturalidade, da cordialidade e do humor, uma flexibilização proporcionada pelo impacto da informação.

Hoje, portanto, enorme a tarefa de um Instituto de Ciências Humanas e Sociais diante da tendência que modela, à escala da História, as instituições, os modos de vida, as aspirações, as personalidades. A mutação sociológica global em curso tornou muito mais complexa a formação. Vive-se uma era inteiramente diferente daquela na qual este Instituto foi implantado o que valoriza, ainda mais, os fundamentos do mesmo, base que propiciou chegasse o ICHS ao III milênio dotado de todos os recursos culturais e pedagógicos para conviver com um novo contexto deste início do século XXI.

É que nos dias atuais impõe-se o máximo possível de opções com um mínimo de normas; o máximo de desejos com pouca austeridade.

O educador hodierno tem que exercitar ainda mais a compreensão, uma vez que se acentuou uma aversão ao mínimo de constrangimento. Daí a necessidade, que se observa hoje, da psicologização das modalidades de socialização. Vive-se num regime homeopático e cibernético. Mais do que nunca toda programação tem que ser opcional, quase a pedido. Exigindo procedimentos inseparáveis de novas finalidades e legitimidades sociais. O culto da libertação pessoal cresceu e em torno dele novas estratégias de ação devem ser implementadas. Mais do que nunca é necessário evitar afogar as particularidades idiossincráticas numa lei homogênea e universal e isto exige uma admirável maleabilidade, mesmo porque se acentuou, ainda mais, a aceleração da História, jogando a cada hora por terra as regulamentações fixas e estandardizadas.

No entanto, os valores individualistas não podem simplesmente impor suas indeterminações constitutivas. Não se pode simplesmente modular as instituições ao sabor das aspirações dos indivíduos, mesmo porque o desenvolvimento da personalidade supõe um mínimo de normas a serem observadas sob pena de se institucionalizar o caos pessoal e social. Pulverizar as regras da conduta e se sacrificar ao individual significa a anemocoria, numa disseminação de desejos ao léu de um subjetivismo deletério. A própria realização pessoal fica comprometida e o respeito pela singularidade subjetiva deturpada. Não se pode abolir toda e qualquer norma de controle pessoal e coletivo sob o jugo de uma ideologia individualista numa mutação aberrante na ordem dos valores que preservam o progresso individual e da sociedade como um todo. A lógica individualista tende a atropelar os costumes e o quotidiano. O viver livre e sem coação, o escolher o seu modo de existência são anelos que devem se adequar ao princípio de que o bem comum está acima do bem particular.

Não é fácil administrar os conflitos atuais!

Quando o termo globalização está na ordem dos acontecimentos, é preciso enfrentar a estratégia global do processo de uma personalização acentuada, de um individualismo hedonista. Saber manobrar os aparelhos de gestão neste clima de individualização inteiramente liberal é uma arte que, pelo que se sabe, os atuais dirigentes do ICHS têm sabido, com discernimento maravilhoso, executado evitando traumas e conflitos fatais.

Com isto surge um ambiente sabiamente climatizado, atingindo o Chung Yung preconizado por Confúcio, ou seja, o virtus in médio aristotélico, aquele equilíbrio que conduz à ataraxia, serenados os ânimos numa quietude beatífica, mas que não amordaça o dinamismo necessário aos grandes esforços, visando o aprimoramento individual e social. Não há então a morte do desejo, nem a amputação da expressão e realização do eu, mas afloram personalidades abertas à realidade de um mundo inteiramente novo, mas que não pode romper com princípios fundamentais sem os quais nada de consistente se constrói.

É deste modo que se orientará a sociedade pós-moderna colocada sob a égide de dispositivos abertos e plurais.  Não se pode, porém, banalizar a inovação, nem se perder a noção objetiva de um progresso bem fundamentado, sob pena de se construir castelos de areia. Seria um erro calamitoso dissolver a confiança e a fé no porvir.

Virgílio (Geórgicas, liv. III, v. 284) dizia na época do esplendor romano fugit irreparabile tempus – foge o irreparável temposendo seu intento chamar a atenção para que cada um se apartasse das futilidades, valorizando cada instante, donde o provérbio antigo age quod agis – aplica a tua atenção no que estás fazendo. Sêneca podia escrever as célebres Epistolae morales ad Lucilium, ensinando-o a bem viver.Tudo isto visando um futuro melhor.

Hoje, porém, tão alucinante é o passar das horas pela influência de toda a parafernália tecnológica de que dispomos, que o perigo é, de fato, cair no vazio descurando-se inteiramente do devir.

Não se “mata” mais o tempo, o que comprometia o futuro, mas se nota um endeusamento passional do presente, violentando o que há de vir. É o domínio do imediatismo para se ter o máximo de prazer momentâneo.

O risco que corre o planeta é disto a prova mais contundente a ponto de, num amanhã muito próximo, vir a faltar a água, dado o egoísmo com que  a mesma é malbaratada mundo todo. A degradação do meio ambiente é sumamente sintomático nesta série de considerações. Falta um projeto histórico consistente, mobilizador. Assistimos a apoteose da filosofia e prática daqueles que cuidam absorventemente do que dá vantagem imediata, fruto evidente da mentalidade hedonista e consumista que atinge o seu auge na época pós-moderna.

Gastam-se a torto e a direito até mesmo os recursos naturais.

O pavor da obsolescência acelerada leva a um curtir equivocado do presente, afogando no transitório as grandes potencialidades do ser racional. Consome-se a própria existência nesta hipertrofia do deleite e do consumo.

Uma flutuação existencial que não leva a nada e que não é remediado nem pelo ecologismo, pelo psicologismo, sendo sumamente grave a baixa estima em que se imergem tantas mentes talentosas.

Entretanto, que há a outra face do pós-moderno que pode ser explorada no sentido de se obviar tais distorções. É aí que atuam magnificamente, sabiamente, os atuais dirigentes do ICHS, mas contando com uma base que foi lançada nos primórdios deste Instituto, a qual foi aqui hoje rememorada.

Em síntese, há, entretanto, áreas que, de fato, podem ser trabalhadas para se contornar os males apontados do atual contexto.

Árdua tarefa trabalhar com os novos alunos que apresentam uma sensibilidade psicológica especial, desestabilizada, mas tolerante, centrada sobre a realização emocional de si próprio, ávida de juventude, de ritmo, menos empenhada em triunfar na vida do que em realizar-se de modo contínuo na esfera íntima.

Inocular, então, no surto individualista, induzido pelo processo de personalização, o sentido da importância histórica de cada um, retomando a idéia de uma continuidade construtiva no tempo que parece se esvair, mas que permite se construa algo consistente para além de atitudes hedônicas que giram em torno de ilusões.

Então se perceberá que o social, a res publica, tem algo de sólido que pode ser um ponto de ancoragem emocional estável.

Tarefa penosa tanto mais que a nosografia nem sempre acompanha os distúrbios psíquicos de muitos jovens que vivem esta era pós-moderna.  Muitas vezes a própria terapia tem um efeito indiossincrático com prognóstico nada favorável no caso de uma não pronta-supressão.

Entretanto, por tudo que foi aqui recordado do passado do ICHS, se pode concluir que este Instituto está apto para enfrentar estes desafios da hora presente, dando seqüência ao que foi plantado há 24 anos, que depois floriu, deu frutos e é a grande esperança desta região e de toda a pátria no novo milênio no qual o ICHS há de se firmar ainda mais como o celeiro de beneméritos da sociedade, de construtores de uma nova ordem social, de profetas de um porvir luminoso para além de todas as questões.

Como é gratificante tomarmos sempre conhecimento das atividades de ex-alunos do ICHS que prosseguiram seus estudos e fizeram o mestrado, o doutorado, tendo sucesso nos Concursos para diversas Universidades, ou que exercem nos Colégios, com proficiência, o magistério, aplicando o que aqui aprenderam. Artigos publicados em Revistas especializadas revelam uma cultura profunda e atualizada.

Nada mais dignificante, porém, do que solidificar as conquistas, vislumbrando um devir ainda mais glorioso para este Instituto, sobretudo, neste ano jubilar do gloriosíssimo ICHS.

FONTES

  • ARQUIVO PARTICULAR DO AUTOR
  • RELATÓRIO DAS ATIVIDADES – 1982-1988 – Diretoria do ICHS
  • Jornal O ARQUIDIOCESANO – 1959-1994, Mariana, Editora D. Viçoso
  • Revista RUA DIREITA – 1973-1982, Mariana, Editora D. Viçoso
  • PRONUNCIAMENTO do Prof. Dr. Luiz Carlos Villalta, 8.01.2002
  • INFORMAÇÕES ORAIS da Secretaria da Diretoria do ICHS – 2003-2004